Apaixonando-se Novamente pela Vida
Impressões da Quarta Semana nas Terras do Estrogênio
Ao longo dessa semana refleti muito sobre as circunstâncias da vida que me trouxeram até esse ponto. Toda a incompreensão e inconformidade durante a infância, a despersonalização ao longo da adolescência e finalmente a negação dos últimos anos. Aos poucos fui me tornando uma pessoa amarga e infeliz, para não dizer miserável. Tornei-me uma viciada por realizações. Sucesso deixou de ser fonte de felicidade para se tornar uma necessidade. Eu era o que fazia e o menor sinal de fracasso era capaz de me derrubar. Brigava com tudo e todos ao meu redor por futilidades e por pouco em algumas dessas várias ocasiões não afastei definitivamente o amor da minha vida. Não percebia o quanto manter a máscara que a sociedade me impusera, o quanto esconder os meus mais profundos desejos drenava as minhas energias. Era um misto de vergonha, frustração e total falta de perspectiva de vida. A terapia revelou o nome de alguns de meus demônios e me forneceu as armas para combate-los, mas foi só com a hormonização que realmente reuni as forças para a batalha. O que começou como um grito desesperado, uma última tentativa de ser feliz, tem se mostrado cada vez mais um experimento muito bem sucedido. Foram inúmeros alumbramentos nesse último mês e com cada um deles me aproximo mais de ser a mulher que aquela garotinha sonhara há três décadas. Ainda me surpreendo como é possível ser feliz simplesmente por existir.
Não sei se a fome diminui ou eu que me acostumei. O cansaço e o sono continuam os mesmos, mas não acho que a contribuição hormonal seja mais a principal. Felizmente, falta menos de um mês para as férias. O desconforto testicular sumiu assim como pelo menos metade de seu volume. Colocá-los de volta no lugar de onde não deveriam ter saído, nunca foi tão fácil. Parece até que eles aprenderam o caminho sozinhos. Ereções só quando realmente estimulada. Dureza incontrolável, agora, apenas nos mamilos. Eles cresceram um pouco e estão bem mais pronunciados. A sensibilidade também aumentou consideravelmente para o bem e para o mal. E um incômodo latente nos peitos me acompanha quase que constantemente com ocasionais espasmos, ardências e coceiras.
As grandes novidades dessa semana foram as famigeradas oscilações de humor e o caso do súbito desaparecimento de pelos na minha barriga. Quanto à primeira, já estava achando estranho não terem mostrado as caras até então. Sinto que posso passar continuamente de um estado de alegria plena para a tristeza total em um estalar dos dedos. As lágrimas agora estão temperadas com os mais diversos sabores, não somente tristeza e felicidade, mas jorram também em diversos outros contextos que ainda não consegui catalogar adequadamente. Já sobre a segunda, foi uma das constatações mais felizes reparar que meus pelos, sobretudo na barriga, estão mais claros, esparsos e finos. Mesmo sem me depilar há duas semanas e, por isso com pelos consideravelmente longos, não mais consigo discerni-los claramente no espelho. Como é bom ver as fontes de disforia aos poucos desvanecendo. Espero que esse desaparecimento continue surgindo em outras partes do corpo, não quero ter que recorrer ao laser para nada além do rosto. Por falar nisso, sexta criei coragem e fui fazer a minha primeira seção de depilação completa na barba. Antes só tinha feito na faixa de barba. A dor tinha sido tão intensa e as reações (foliculite e vermelhidão) tão incômodas que procrastinei desde agosto para voltar. Essa foi uma daquelas raras vezes que somos premiadas por enrolar: não só ganhem um desconto de 50% por causa da Black Friday, como trocaram o laser por um bem mais moderno e significativamente menos dolorido. Não que não tenham sido dez minutos da mais horrível agonia.
De certo apenas que iniciei essa jornada sem grandes expectativas, sobretudo do ponto de vista emocional, mas a cada dia que passa são elas que me fazem seguir em frente.
Renew our faith which way we can
To fall in love with life again…