As Aventuras de Gabi nas Terras do Estrogênio — Centésima Sexagésima Sexta Semana

Verão e Corpo

Férias de verão, muito calor, país tropical, tudo isso pede por praia e piscina. Muita água para refrescar e relaxar, ainda mais depois de um par de anos muito complicados e sem nenhuma folga. Vontade de pular na água nunca faltou. Mas e o medo? Um misto de vergonha e receio com o próprio corpo. Será que as pessoas vão ficar me medindo, procurando por qualquer característica que denuncie a minha travestilidade, só para ser agredida ou feita de chacota logo em seguida? Será que o biquíni vai segurar a coisa? Escondendo-a contra o olhar mais minucioso e não a deixando escapar conforme nado? Dúvidas paralisantes que me impediram de aproveitar muita coisa.

Não é o meu primeiro verão como eu mesma. Nem a primeira vez que exibo o meu corpo em um biquíni. Já havia ido à praia em duas ocasiões anteriores. Contudo, em nenhuma delas eu me senti confortável. Tanto que nem na água tive coragem de entrar. Vai que a coisa se solta. No máximo, caminhei timidamente pela praia sentindo o peso do olhar alheio. E olha que nessas ocasiões eu ainda não estava completamente ciente da minha disforia genital. Algo que realmente se revelou nesse último ano.

Fomos, a esposa e eu, convidadas a passar alguns dias na casa de amigos que conhecemos pela internet, ao longo desse aparentemente infindável interlúdio digital que se apoderou de nossas vidas. Eles disseram para virmos preparadas para usar a piscina. Não lembrava da última vez que pulei em uma. Mesmo sem sabermos como seria o ambiente, compramos biquínis. Não custava muito estar preparada. Para a minha surpresa, nem foi tão difícil encontrar um que resolvesse todos os meus problemas. Faltava apenas saber se conseguiria usá-lo.

Nos primeiros dias, o tempo não ajudou. Muita chuva e temperaturas mais baixas deixaram a piscina gelada. Mas, no sábado passado, o Sol abriu e, no domingo, as condições de contorno estavam ideais. Rumores corriam de que daria piscina. Os demais presentes se arrumaram. Bateu aquela ansiedade. Por um lado, queria muito mergulhar, nadar e me refrescar um pouco. Por outro, estava um pouco receosa. A estada até então tinha sido super confortável. Super gostosa, para ser mais precisa. Mas teria que colocar o biquíni. Mostrar partes do meu corpo com as quais ainda não fiz completamente as pazes.

Arrisquei. Afinal, não fazia ideia de quando outra oportunidade tão boa quanto essa apareceria. Coloquei o biquíni, aquendando com o maior esmero. Cheguei timidamente e entrei na água com o maior cuidado possível, descendo pela escada. Nada de pular na água ainda. Não estava nem um pouco confiante que a calcinha aguentaria. Aquele geladinho gostoso. Comecei a me mover e a perceber que estava tudo bem. As coisas permaneciam nos seus devido lugares. Ousei nadar. Ousei me refrescar. Ousei me divertir. E foi muito bom!

De comentários, apenas os positivos: Gabi, você tem um corpo muito bonito! Fazia tempo que não me sentia tão bem! Tão confortável na minha própria pele! E como isso é bom! A euforia com a transição, que julgava parte do passado, aparentemente ainda existe. Vou mesmo aproveitar enquanto durar, porque este ano promete.